Nunca pensei que os "olhos do meu coração, no dizer de S. Paulo, revelassem pormenores por mim julgados completamente esquecidos...
Quarta-feira, 31.10.07

        IGREJA DA SANTÍSSIMA TRINDADE

 

         Transpomos a aberta, imensa porta

          onde, em meio de nuvens,

          nos acolhe, voando parada,

          a  Pomba de Espírito Santo

          e somos purificados

          desde a entrada.

 

          Depois, ficamos inundados de Luz:

          da Luz que vem do Cristo, em agonia,

          imolado na Cruz,

          em frente do Cordeiro,

          da Virgem e dos Santos,

          e do Céu, todo inteiro.

 

         O homem trabalhou, por sua mão,

         com ouro e terracota,

         o  imponente painel

         que ajuda àquela Transfiguração.

 

         Nós sabemos que o brilho

         do ouro não se apaga.

         Jamais se apagará a Luz de Deus 

         e foi ela que trouxe,

         a esta nova Igreja,

         o nome que ela tem

         e a Beleza dos Céus.

 

 

 

    

     Clementina Relvas

          Fátima, 23 de Outubro de 2007

 

 

 

 

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Domingo, 28.10.07

                     

Meus queridos netos:

 

Como a neta Cristina já sabe, o Vôvô gosta de contar histórias verdadeiras. Por vezes põe-lhes um bocadinho de pó de arroz e umas verduras, para ficarem mais apelativas, mas, no fundo, são mesmo verdadeiras, e algumas até passadas com ele próprio.

 

Hoje vou transcrever aqui uma dessas histórias que ele escreveu e viveu, com o título que encima esta carta. Começa assim:

                        150 QUILOS DE ALEGRIA

 

Era uma vez, em Angola, numa terra linda, à beira de um grande rio, um dos maiores do Mundo, chamado Zaire, mais conhecido hoje por Rio Congo. Como cidade, tinha dimensões reduzidas, com uma única rua, onde ficava a minha casa, que era enorme, com muitas portas e janelas para deixarem entrar o ar fresco, mas protegidas com uma fina rede plástica para barrar a entrada de furiosos mosquitos que, mal o sol se punha, formavam verdadeiros exércitos.

 

Um belo dia, já tarde, quando me preparava para descansar, chegou ao meu conhecimento que os cipaios (guardas) sob o meu comando tinham detectado no rio uma piroga carregada de contrabando a caminho do Congo Belga, hoje denominada República Democrática do Congo, que ficava a montante. Como, propriamente, não era assunto da minha competência, mas sim do chefe da Alfândega local, mandei-o chamar à minha presença para se tomarem medidas. Mas disseram-me que ele se ausentara há já vários dias. Então dirigi-me à sua casa, que ficava no outro extremo da longa rua, a fim de perguntar à esposa para onde tinha ido o marido e quando regressaria.

 

Cabe aqui dizer que o alfandegário se chamava Sr. Palito, Jorge Palito, e que a senhora dele era a Dona Delfina Palito, uma pessoa fenomenalmente obesa, pelo que era conhecida nos meios mais chocarreiros do sítio como Dona Delgrossa Palito. E como eles tinham razão, pois a senhora era mesmo muito gorda. Ela não dizia o peso, mas dizia-se, à boca pequena, que rondava os 150 quilos!

 

Quando conheci pela primeira vez o Sr. Palito, até julguei que também era uma alcunha, porque o homem, ao contrário da mulher, era magríssimo. Como os habitantes angolanos menos cultos, os então chamados “indígenas”, o tratavam por sr. Paulito, convenci-me de que o nome dele era Paulo, e foi assim que o tratei da primeira vez. Mas ele foi rápido dizendo-me: “Palito, meu caro senhor, Palito!”, enquanto, em posição de sentido, batia com os tacões dos sapatos um no outro produzindo um forte som surdo, à maneira militar, embora ele o não fosse. “Desculpe-me sr. Palito”, emendei eu logo a seguir, mas medindo de alto a baixo toda aquela magreza!

 

O meu primeiro encontro com a Dona Delfina foi diferente. Deu-se no baile do clube, A senhora, toda vestida de seda preta, com um grande leque de rendas da mesma cor, abanava-se a si própria e às bandas do vestido, comprido até ao chão,ocultando os pés, pelo que parecia deslizar vagarosamente pela sala, esvoaçando. Lembrei-me repentinamente de certos entes estranhos que vira uma vez no cinema num documentário sobre a vida nas profundezas dos oceanos! Mas, quando ma apresentaram, daquela mole de carne destacou-se uma face gorda sim, mas simpática, muito risonha, com dentes muito brancos a luzir. E eu pensei, ora ali estavam cento e cinquenta quilos de alegria. E senti-lhe grande sinceridade quando ela disse: “Bem-vindo a esta terra perdida, que hoje ficou mais rica com a sua juventude. Tenho pena de não poder apresentar-lhe a nossa bela filha, que deve andar pela sua idade, mas está em Luanda a estudar”.

 

 Nesse tempo eu tinha apenas vinte e sete anos e ainda era solteiro, pelo que também fiquei com pena...

 

Posto isto à laia de intróito, voltemos ao terreno da história.

 

Chegado à casa do sr. Palito, um edifício muito antigo em ferro e madeira, com uma porta amarela, do tempo do Norton de Matos, seguido por uma dúzia de “indígenas” curiosos, preparava-me para dar uns toques na porta amarela, quando um deles me diz: “Patlão, gente já bateu. Siôraglita memo, não able. “Não abre?” disse eu e perguntei: “E o Sr, Palito onde está?” “Não tem siôr Paulito, sim siôr”.

 

Já pensando no pior, pois naquele tempo, de dia, ninguém tinha as portas fechadas, bati duas vezes com os nós dos dedos. De dentro veio a voz aflita de Dona Delfina: “Acudam-me!”.  Respondi logo: “Sou eu D. Delfina, abra a porta”. “Não posso!”. “Não pode porque?” “Não chego lá!” “Então vamos ter de a arrombar” “Não, não façam isso”. “Porque?” Resposta imediata e aflita: “Ai o roupão, o roupão!”

 

Parei alguns segundos a pensar naquelas respostas sem sentido e prossegui: “O Sr. Palito está aí?” "Não, tenho muita sede, quero água!", respondeu ela. “E o seu marido para onde foi?” “Há três dias e três noites que não estou com ele.”

 

Nisto chega ao pé de mim o Felício Maiombe, meu ajudante. Disse-lhe: Aqui há gato, Felício! Temos de arrombar a porta já. Vai à carrinha e trás de lá a marreta. Dona Delfina, lá dentro, ouviu e desatou numa berrarria infernal: “Não, não, por amor de Deus! O roupão! O roupão!”.

 

Pensei: Que mistério será este? A senhora deve estar amarrada do pés à cabeça para não poder abrir a porta. O marido não está com ela há três dias e três noites por isso ela está cheia de sede e de fome. Mas o roupão, o que quererá ela dizer com o malfadado roupão? Ou estará ela doida?

 

O Felício chegou com a marreta. Bastou uma pancada e a porta já carunchosa abriu-se logo. Com o barulho a senhora lá dentro gritava cada vez mais: “Não! não! não venham!”

 

 O que se estaria a passar? É o que vamos já saber, após um pequeno intervalo para a

 

 

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Eu e o Felício avançámos a correr e vimos, pelos ruídos, que a senhora devia estar na casa de banho. Para lá nos dirigimos e eu, fazendo sinal ao Felício para parar, fui espreitar de mansinho e, com um certo pudor, espreitei pela porta semiaberta e vi... Oh, meu Deus, o que vi eu? um monte de carne viva a tremer. Era a Dona Delfina estatelada no chão completamente despida. Escancarei a porta e por detrás dela, num cabide, lá estava o famoso roupão. Peguei nele e atirei-o para cima da Delfina que num suspiro só disse “obrigada!”. Mas porque não se levantava ela do chão? Oh! Maldição, coitada da senhora, era tão gorda, tão gorda, que só conseguia erguer-se com o auxílio de alguém possante! E estava aquela boa alma estendida no chão, há três dias e três noites, sem comer, nem beber, completamente despida a ser mordida por milhares de mosquitos esfomeados! Se fosse num país frio não resistiria!

 

“Felício, anda cá ajudar”. Mas qual quê, nós dois, com o maior cuidado para não destapar a senhora, não conseguíamos sequer movê-la. “Felício, vai lá fora e traz contigo o preto mais matulão que encontrares”. E assim foi.

Com muito esforço, os três, lá pusemos a pobre de pé. Amparada, caminhou com muita dificuldade até ao quarto e deitou-se com um grande suspiro.

 

Nisto, nem de propósito, chega o Sr. Palito que logo tomou conta da ocorrência. E eu, baixinho, disse ao ouvido do Felício: “Pronto, vamos embora, agora que chegou o lingrinhas, o assunto é com ele”.

 

Cá fora, os cipaios esperava-nos e diziam: “Senhor, os contrabandistas já fugiram pelo rio acima!” Mas que dia, hein!

 

                                                           FIM

 

Beijinhos e até à próxima.

 

 

 

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Sábado, 27.10.07

                  O HIPOPÓTAMO AZUL

 

     A falar verdade, a menina nem sequer gostava de hipopótamos. Nem muito nem pouco. Tinha visto um no Jardim Zoológico e achara-o «bué de feio»: cheio de pelancas a caírem-lhe umas sobre as outras como carapaças, um corpanzil enorme mas a terminar por uma cabeça relativamente pequena, de olhos quase fechados e orelhas que parecia terem pertencido a um leitãozinho, só que mais escuras, cor de terra, o que também não admirava, porque andava sempre a rebolar-se na lama. E, depois, aquela bocarra!

    

     Ficara, portanto, decidido: não gostava de hipopótamos. Até ao dia em que a Mami lhe apareceu em casa com um hipopótamo azul que tinha um sinal particular: um coração vermelho no lugar do rabinho. Apesar de não achar esse lugar o mais adequado para se ter o coração, achou graça e, na primeira oportunidade, correu logo a mostrá-lo à sua Vóvó. Além de que ficou muito contente e comovida, ao ouvir o que a Mãe lhe disse:

    

     - Ouve, filhota, o coração significa o amor que eu tenho por ti, não importa o sítio onde ele esteja ou onde estejas tu. É o meu coração, disso podes ter a certeza.

 

     A menina tinha muitos brinquedos, sobretudo animais de peluche, amorosos e fofinhos, mas logo colocou aquele à frente de todos, na prateleira, para o ver mal entrasse no quarto.

               

    

     Naquela noite, sem ninguém dar por isso, a bicharada reuniu-se toda e resolveu organizar uma recepção ao novo amigo. Mal imaginando o que estava para acontecer, fizeram danças de roda, pularam e pularam até ao amanhecer. Cansados pela folia nocturna, voltaram para os seus lugares na prateleira e, quando a menina acordou, fixou logo os lindos olhos, que também eram azuis, no seu querido hipopótamo.

 

     Tão querido que, daí a dias, quando decidiu com a Mami dar os seus peluches todos a meninos dum bairro pobre que nunca tinham tido brinquedos, a menina pediu:

 

     - Ó Mami! O hipopótamo não. Ainda há pouco mo deste e eu já estou habituada a ir para a cama, abraçadinha a ele. É tão fofinho, tão querido… Nunca julguei que alguém pudesse fazer um hipopótamo de veludo, tão suave e tão lindo, embora tenha algumas parecenças com o feioso do Jardim Zoológico.

 

     - Está bem, filha. Eu nunca faria isso e fico muito contente por gostares assim tanto do teu hipopótamo azul.

   

     - E do coraçãozinho vermelho que representa o teu amor por mim… Nunca me vou separar dele.

 

     A Mãe fez um sorriso enigmático – ela bem sabia que a menina havia de crescer e criar outros afectos – mas não disse nada.

 

     A partir desse dia, a menina nunca mais se esqueceu de levar o hipopótamo azul para onde quer que fosse e adormecia sempre abraçadinha a ele, tal como tinha dito.

 

     Até quando? Sem deixar, de se lembrar do seu querido hipopótamo, a menina irá um dia pô-lo de lado. Pelo menos quando tiver o seu primeiro namorado, e, sem dúvida, quando tiver o seu primeiro filho, que lhe há-de ocupar os braços e ocupar o melhor lugar no seu coração. E daí, quem sabe? Talvez o guarde muito bem guardadinho para, quando chegar a altura certa, o oferecer a esse seu filho, como recordação da sua Vóvó que, ao ver tal gesto, procurará esconder uma lágrima de emoção num sorriso de ternura. 

 

 

Lisboa, 19-09-07

 

                         Clementina Relvas

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Quarta-feira, 17.10.07

            Meus queridos Netos:

 

 

            Quando o meu Pai e a minha Mãe planearam o meu futuro – o futuro nunca se pode planear pois é cheio de imprevistos ou como diz o ditado: “…a Deus pertence”, decidiram como já disse, que eu iria fazer o Curso Geral de Comércio o qual, em quatro anos com aproveitamento, nos dava possibilidade de nos tornarmos funcionários médios, no Estado ou Empresas Privadas.

 

            Assim, pensaram eles. Empregar-me-ia e ajudaria a pagar os estudos da minha irmã, mais nova do que eu quatro anos precisamente. Mas, ao contrário de mim, a Maria Alice, embora inteligente, nunca gostou de estudar. E, sem grande vontade, aceitou ir para Lisboa mas para tirar, como a minha Madrinha, um Curso de Corte e Costura.

 

            Sem entusiasmo e cheia de saudades dos Pais, só aguentou um ano em casa de meu Tio. Regressou à nossa aldeia, onde se sentia bem e era muito estimada e onde só nos encontrávamos nas férias grandes, claro. Éramos e ainda somos muito amigas mas tivemos vidas muito diferentes: eu corri meio mundo – Lisboa, Açores, Angola, Moçambique, S. Tomé, novamente Lisboa, depois outra vez Açores e Lisboa sempre em trabalho, enquanto ela ficou muitos anos na aldeia onde casou com um rapaz duma freguesia próxima para onde foi morar passados uns anos e onde teve os seus quatro filhos. De lá só saiu para o Porto, quando foi ao casamento do seu filho mais velho, o Carlos, para o casamento da Minda e, infelizmente, depois muito frequentemente por causa da gravíssima doença que a atingiu há alguns anos.

 

            Em Távora, era essa a terra do marido, este tinha muitas propriedades herdadas do Pai e tornaram-se agricultores prósperos, pois cultivavam muitas árvores de fruto, principalmente videiras e cerejeiras. Tiveram de trabalhar muito: ela na lida da casa e a criar os filhos e ele no campo muitas vezes para evitar contratar mais um jornaleiro, fazendo o trabalho deste. Mas aumentaram as suas propriedades e agora, já com idade avançada, têm a ajuda do filho mais novo, o único que também escolheu a agricultura e a vida da aldeia, e da nora que muito os estima.

 

            E assim se explica que eu tenha continuado a estudar: ao acabar o Curso Comercial: como os estudos da minha irmã estavam definitivamente postos de parte e, como os meus professores insistiam em que eu fosse fazer o Curso de Letras, para o qual me achavam grande vocação, eu atirei-me ao estudo e nunca mais parei.

 

            Quando acabei o curso, concorri para o ensino pois, de facto, a minha vocação era ser professora.

 

            Já tinha leccionado, no ano dedicado à elaboração da minha tese de licenciatura, “Fialho de Almeida e as Artes Plásticas”, num colégio particular que então havia em Almada, tendo de fazer todas as manhãs a travessia do Tejo num cacilheiro. Mas ficava com a tarde em grande parte livre para os meus estudos.

 

            O meu professor Doutor Jacinto Prado Coelho prometeu-me a primeira vaga de assistente quer houvesse na Faculdade. Como estas vagas eram raras, tive de me candidatar ao ensino secundário. Mas, como o grande concurso era em Maio e nós só obtínhamos a licenciatura em Julho, poucos lugares nos restavam. A mim, apesar da minha alta classificação, ofereceram-me um lugar de professora de Inglês no Norte ou dar aulas nocturnas numa Escola Técnica. Pus de lado ambas as hipóteses até porque, entretanto, uma pessoa amiga conseguiu saber no Ministério que havia vaga para uma professora de Francês no Liceu Antero de Quental, em S. Miguel nos Açores. Esse ano lectivo, de que ainda falarei, considero-o como um ano de férias maravilhosas, apesar de ter muitas turmas e, além do mais, tratando-se de uma principiante, ter tido sempre muito trabalho, com a preparação das aulas, pois da Faculdade saía-se com conhecimentos meramente teóricos.

 

            Apesar da inesquecível experiência dos Açores, no ano seguinte não resisti à tentação de Lisboa e fui dar aulas no Liceu Maria Amália, onde fiquei três anos agradáveis até conhecer o Vôvô, casarmos e irmos para Angola.

 

            Como chegámos em Fevereiro e ainda para mais eu estava no quarto mês de gravidez do meu primeiro filho, só fui trabalhar para o Liceu Paulo Dias de Novais, de Luanda, em Outubro, e só durante um ano, em que nasceu o Zé António, pai do Zézinho. Tinha ele oito dias quando fomos com o Vôvô para a Caála, uma pequena cidade perto do Huambo, e, durante dois anos, fui professora de Português do terceiro ciclo no Liceu de Nova Lisboa, hoje Huambo. Aí ficámos dois anos e foi lá que nasceu o Quim, pai da Cristina. O Liceu ficava a vinte quilómetros, em óptima estrada alcatroada, quase toda ela uma recta. Apressei-me a tirar a carta de condução e lá ia eu todos os dias com uma colega de matemática a quem dava boleia. As aulas decorreram sempre na normalidade.

 

            Tirando os sobressaltos da guerra que irão constar de outra carta, a nossa vida decorreu pacífica e agradável, a ver crescer os dois bebés naquele clima de planalto, tão saudável. Tínhamos muitos amigos, em particular um casal da nossa idade e com um filho da idade dos nossos, com o qual dávamos grandes passeios, naquele imenso planalto, por vezes com mais de dois mil metros de altitude. O Monte Moco, por exemplo, atinge dois mil e seiscentos metros.

 

            Mas não era preciso ir muito longe para apreciar paisagens deslumbrantes. Basta dizer que na Primavera os campos ficavam esmaltados de cosmos vermelhos, brancos, cor-de-rosa, amarelos, numa paleta de cores como nunca mais encontrei.

 

            Mas passados esses dois anos fomos para Luanda, onde o Vôvô foi ocupar um cargo nas Obras Públicas e eu fui leccionar para o Liceu Salvador Correia, onde fiz o estágio e fui professora metodóloga durante alguns anos. Nessa qualidade e com outros colegas, fui por duas vezes a Moçambique integrar o júri nacional de exames e, muito bem recebidos, tivemos o privilégio de nos mostrarem algumas belas paisagens e também os hipopótamos, em plena liberdade, no Rio Limpopo.

 

            Ainda em Angola, acompanhei um grupo de jovens estudantes a S. Tomé, ilha que ficou gravada na minha memória, desde a magnífica Baía de Ana Chaves, onde a capital está implantada, até às roças de cacau, com as suas típicas casas coloniais ricas e enormes, mergulhadas no verde da vegetação luxuriosa e todas com praias lindíssimas, como a célebre Praia das Sete Ondas.

 

            Os dezassete anos de Angola foram cheios de peripécias mas, no conjunto, foram anos felizes. Como vos disse numa carta anterior, escreverei, lá mais para diante, algumas cartas dedicadas à vida dos vossos pais e dos vossos avós nessas terras de gente maravilhosa.

 

            Chegou então a época da descolonização e, como já disse, quase todos os portugueses e muitos africanos naturais das antigas colónias vieram para Portugal com o impróprio nome de “Retornados”, embora a grande maioria, mesmo portugueses, nunca tivesse estado em Portugal.

 

            Em Lisboa, onde nos fixámos, tivemos de criar novamente, a pouco e pouco, um novo lar. Alugámos então, por sorte e por intermédio de uma amiga, um apartamento que tinha vagado na parte da manhã. Mas, como corriam boatos de que essas casas eram logo ocupadas ilegalmente de noite, como garantia, fomos dormir lá nesse mesma noite, e no chão, porque, quanto a mobílias, durante alguns dias, “desfrutámos” apenas de uma cadeira e de uma mesinha de jogo cedidas amavelmente por uma vizinha de outro andar!

 

            Passados cinco anos, já os filhos andavam na Faculdade, partimos para os Açores, mais exactamente para Angra do Heroísmo, onde o Vôvô foi exercer um cargo num organismo estatal criado especialmente para proceder à reconstrução das ilhas mais devastadas pelo grande terramoto que ocorreu naquela Região Autónoma em 1980. E eu fui fazer formação profissional de professores para a Secretaria Regional de Educação, o que, além do mais, me permitiu percorrer as ilhas todas e ficar a conhecer bem o Arquipélago, até melhor do que muitos açorianos

 

            Cerca de cinco anos depois, em 1985, regressámos definitivamente a Lisboa. E desses cinco maravilhosos anos de trabalho nos Açores há tanta coisa interessante para contar, que prometo retomar o fio da meada numa próxima carta.

 

Até breve. Beijinhos.

 

           

 

           

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Sábado, 13.10.07

                                 Havia a veia de água                             

                            que corria

                            mansinho

                            para o rio,

                            para o mar.

                            E havia este braseiro

                            que é a vida

                            e a queria secar.

 

 

                            E a veia de água,

                            a custo, resistia

                            mas lá ia, lá ia...

 

 

                            Era uma gota apenas

                            de água pura

                            mas resumia a luta

                            e tinha o gosto fresco

                            da aventura.

 

 

                               30 Abril 1984

 

                          Clementina Relvas

 

 

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Quarta-feira, 10.10.07

            Meus queridos netos:

  

Hoje vou começar por vos falar de moedas muito velhinhas, algumas das quais nem eu, sequer, conheci.

 

            Quando eu nasci, o dinheiro que circulava era, como agora, em notas de papel e em moedas. As que passavam mais pelas minhas mãos eram, claro, as moedas mais pequeninas e, mesmo estas, raramente.

 

            Tinham ficado para trás muitas moedas em ouro, prata e outro metais menos valiosos. É interessante saber que as primeiras moedas mandadas cunhar por D. Afonso Henriques, se chamaram dinheiro e mealha (metade de um dinheiro e cujo nome deve ter vindo da palavra migalha, pois se tratava duma parte da moeda principal). Mas a estas seguiram-se muitas outras, algumas com nomes bem engraçados: o morabitino, de D. Sancho I, o tornês de D. Dinis, a barbuda, o gentil, o real, todos na primeira dinastia. E depois o ceitil de que fala Gil Vicente, o chinfrão, o escudo ainda no tempo de D. Afonso V, o vintém, o cruzado, o engenhoso – nome derivado da alcunha de seu fabricante. A inovação principal da dinastia filipina foram as moedas em ouro e D. João IV mandou cunhar uma moeda em prata, a que chamou conceição, em homenagem a Nossa Senhora, que ele coroou Rainha de Portugal, oferecendo-lhe a sua própria coroa. Com D. João V e a abundância do ouro vindo do Brasil surgem várias moedas de ouro a mais importante das quais é o dobrão de 24.000 réis e este metal continuou a ser preferido até ao reinado de D. Maria I que mandou cunhar em prata o chamado cruzado novo. D. João VI e D. Pedro IV tinham emitido uma moeda de bronze muito pesada, o pataco e também o vintém de prata. Mas faltava o maluco que valia 80 réis. Nos últimos reinados cunham-se moedas de bronze de V, X e XX  réis e os tostões de prata.

 

            Com a proclamação da República em 1910, a moeda que teve maior realce foi a de um escudo em prata. A partir daí e até 2001 circularam as moedas de 1, 2,  5, 10, 20 e 50 centavos e as de 1, 2, 5, 10, 20, 50, 100 e 200 escudos. Foram estas as moedas que circularam no meu tempo (também havia notas) E, sobretudo no campo, quem tinha uma moeda de cinco escudos, de que falei numa carta anterior a propósito da Páscoa, já podia comprar muitas coisas. Houve até uma altura em que o escudo português era considerado um moeda muito forte. Lembro-me bem que, em Paris, vimos na montra dum estabelecimento a indicação de que compras ali efectuadas com escudos portugueses (e francos suíços) tinham um determinado desconto... E sabem quanto valeria hoje a moeda de cinco escudos de que falo atrás? Cerca de dois cêntimos e meio!

  

                  

 

A última nota mais recente de 10 contos (10.000 escudos) que circulou em Portugal

 

 

            Mas, na minha infância e juventude, muita gente ainda falava em is: cinco escudos eram cinco mil réis, dez escudos eram dez mil réis até novecentos e noventa e noventa e nove mil réis. A seguir, era o “euromilhões”: a nota de mil escudos que, mesmo assim, se chamava um conto de réis.

 

            Também ouvi falar no pataco, usado em expressões como “comprar bacalhau a pataco”, para mostrar como era barato, mas não lidei com esta moeda. Nem com vinténs, de que ainda falavam as pessoas da idade dos vossos bisavós e de que também ficou o dito “não vale um vintém furado”. Conheci foi o tostão – até vinte e cinco tostões, que era metade de cinco escudos. E vejam de quanto valeriam na altura, pois costumava-se dizer: “para bom melão vinho de tostão” para recomendar que se devia beber um bom vinho!

 

            Quando fui a Nova Iorque em 1980 (releiam a minha carta anterior com o título “É uma terra com muita gente”) era muito frequente encontrar na rua moedas de um, dois e até cinco cêntimos (fracções do dólar) que as pessoas deixavam cair e não se davam ao trabalho de apanhar. Enchi por graça uma tacinha delas, que ainda conservo. Mas se fôssemos ao hipermercado e nos faltasse um cêntimo era certo e sabido que não nos deixavam levar as compras

 

            Mas vintém, pataco ou morabitino, dinheiro sempre foi dinheiro e quando deixou de se praticar a troca directa – um produto por outro – ninguém mais o pôde dispensar. Foi fonte de muitas alegrias mas também de muitas desgraças, sobretudo se as pessoas se deixavam dominar pela ganância, o arranjavam por meios ilegítimos e se serviam dele para humilhar o próximo em vez de o ajudarem.

 

            Agora temos o euro, cujo símbolo é (€) A ele aderiram, por enquanto, os seguintes países da União Europeia: Alemanha, Áustria, Bélgica, Chipre, Eslovénia, Espanha, Finlândia, França, Grécia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Malta, Países Baixos e Portugal. Um euro divide-se em 100 cêntimos, existindo notas de 5, 10, 20, 50, 100, 200 e 500 euros e moedas de 1, 2, 5, 10, 20 e 50 cêntimos e de 1 e 2 euros. Cada moeda em circulação tem uma face comum e uma face que depende do país para que foi cunhada. As notas de papel são idênticas em todos os países aderentes. Quando Portugal adoptou o euro em substituição do escudo, foi calculado que um euro valia 200,482 escudos e foi nesta base que se fez a conversão.

                  

                    A nota de Euro de valor mais elevado (quinhentos euros)

 

                As gerações mais antigas, por vezes, para fazerem uma ideia dos custos dos produtos, principalmente quando se trata de altas quantias, ainda recorrem aos escudos, melhor dizendo, aos contos, fazendo contas de cabeça. Os jovens, fazem o contrário, quando ouvem falar em contos, desejam saber quanto é em euros. Tu, Cristina, já tens perguntado, quando ouves os mais velhos falar em contos: “quanto é isso em euros?”. Ora as contas são muito fáceis de fazer: Por exemplo, se ouvirem dizer que uma casa custa 30.000 contos, e como 1 conto são cerca de 5 euros, multipliquem este número por 5 e já está: 30.000 x 5 = 150.000 €.. O preço da dita casa são 150.00 euros e um pouco mais. Se quiserem converter milhares de euros em contos, divide-se, como é óbvio, os euros por 5 e dá milhares de contos: 150000 € / 5 = 30.000 contos!

               

                Também a importância do dinheiro é sempre a mesma e não se pode viver sem ele. A melhor maneira de o ganhar é através do trabalho honesto e este consegue-se aprendendo, através do estudo, para se ter uma profissão que permita ter uma vida digna.

 

Até breve. Beijinhos.

 

 

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Segunda-feira, 08.10.07

            Nova Iorque, Nova Iorque

 

Meus queridos Netos:

 

            Um país onde não tencionava ir era os Estados Unidos da América, não por não me impressionar um país tão vasto e tão poderoso, ao qual em grande parte ficámos a dever o derrube do nazismo e dos seus horrores, mas exactamente por ser tão vasto que não se podem conhecer senão pequenas fracções suas e por eu ter um preconceito contra os arranha-céus, nomeadamente os de Nova Iorque.

 

            Mas foi exactamente a Nova Iorque que nos levou um convite da Maria José, então colocada nessa cidade, num departamento do Estado.

 

            Que sorte a nossa! Nova Iorque era, e ainda é, apesar do terrorismo, um dos pólos culturais mais importantes do mundo.

 

            Ao contrário do que eu julgava, os arranha-céus que compõem um deslumbrante sky-line, não roubam nenhuma luz às ruas e muito menos às avenidas, todas larguíssimas, com muitas árvores e flores, estas plantadas em vasos que são colocados, periodicamente, em sítios estratégicos.

 

            Tem uma vida cultural riquíssima – museus, exposições, galerias de arte, teatros de ópera, a Broadway e as suas inúmeras casas de espectáculos, o Central Park com actividades muito diversificadas, um nunca acabar de motivos de interesse.

 

A cidade impressionou-nos também pela diversidade dos seus habitantes, oriundos de todo o mundo, alguns morando em bairros específicos: o chinês, o italiano, o alemão onde nós vivemos – e só estou a falar de Manhattan, o coração da Big Apple.

 

Também os comportamentos das pessoas nos causaram espanto: ora se via um homem deitado no meio dum autocarro sem ninguém se impressionar com isso, ora, ao pedir uma informação ao motorista, todas as pessoas que aguardavam na fila revelavam a maior compreensão e paciência, incluindo o próprio motorista do autocarro, sempre solícito. A cada passo éramos contemplados com um sorridente “Have a nice day”, tanto na rua como nas grandes ou pequenas lojas.

 

E um dia aconteceu-nos um episódio cómico mas bem expressivo: vestidos e calçados como turistas que éramos, entrámos num elevador e ficámos de olhos arregalados de espanto pelas toilettes requintadas das pessoas que nele subiam. Julgando ir ver um teatro, num trigésimo andar, vimos o elevador desembocar directamente, em pleno salão dum restaurante de luxo, todo na penumbra, para que os clientes, entretanto servidos por várias e graciosas “coelhinhas”, pudessem lá do alto ver a cidade, feericamente iluminada. O chefe de mesa, todo elegante no seu smoking, veio ao nosso encontro e, escondendo a estranheza que certamente sentiu, perguntou-nos delicadamente o que desejávamos. Como lhe disséssemos que nos tínhamos enganado, levou-nos com um please, a dar a volta ao salão, para também nós nos deslumbrarmos com a iluminação da cidade. Isto aconteceu antes do terrível ataque terrorista às duas Torres Gémeas. Hoje não sei se as coisas se passariam assim.

 

            Mas era na sede das Nações Unidas, onde fomos frequentemente almoçar por intermédio da Maria José e onde assistimos a uma sessão em que Kurt Waldheim, secretário-geral da ONU na época, presidiu à cerimónia da entrada de um novo e pequeno país naquela Organização, que podíamos ver um resumo de todas as raças e nações, com os trajes mais variados e falando “desvairadas” línguas como só se terá verificado na Torre de Babel...

 

            Houve algumas coisas que muito estranhámos em Nova Iorque: o grande número de obesos com que nos cruzávamos a cada passo, a quantidade de colchões, como novos, que todas as manhãs eram recolhidos no lixo da cidade para uma reutilização e os saldos da cadeia de livrarias Barner and Nobel: livros e discos, mal deixassem os tops, eram logo postos à venda por metade do preço. Também nos admirámos ao verificar que nos museus havia selecções de tudo, além do que era normal encontrar nos museus europeus: desde carroças a testemunharem as aventuras do Oeste, até máquinas de costura, telefones, sei lá!, só sei que tal procedimento resultava do facto de se tratar dum país com uma história recente, cuja memória tanto querem preservar. Fomos visitar a Estátua da Liberdade e subimos até à coroa, onde se abrem janelas que proporcionam vistas maravilhosas sobre a cidade e o rio Hudson.

 

 Num fim-de-semana alargado, fomos de comboio a Washington onde, entre outras coisas, visitámos a Casa Branca e o Cemitério de Arlington, no qual está sepultado o presidente Kennedy e fomos ainda ao National Air and Space Museum, museu famoso por nele se encontrar a cápsula que levou Neil Armstrong, Buzz Aldrin e Michael Collins à Lua em 1969, além de outras preciosidades ligadas à aviação e à conquista do espaço.

 

            E foi pena não termos aproveitado a sugestão da Maria José: irmos noutro fim-de-semana, de autocarro, visitar as cataratas do Niagara ou, como queria o Vôvô, fazer um passeio de helicóptero sobre a cidade de Nova Iorque.

 

            Nunca se pode ter tudo e devemos saber ser gratos a Deus por ter criado tantas maravilhas que não cabem na curta duração de qualquer vida humana.

 

Até breve. Beijinhos.

 

 

publicado por clay às 17:30 | link do post | comentar | favorito
Sábado, 06.10.07

                        

Meus queridos Netos:

 

            Retomando a minha narrativa sobre as grandes cidades da Europa Central que visitei (releiam a carta anterior), depois de Praga, capital da República Checa, atravessando o Vale do Danúbio, seguimos para Budapeste, capital da Hungria. Situada nas margens do rio Danúbio, está dividida em duas cidades totalmente diferentes: dum lado Buda com o Bastião dos Pescadores, onde se podia comprar artesanato muito original e a Igreja Matias; do outro Peste, uma cidade mais moderna, com o seu imponente Parlamento ocre e branco debruçado no rio e a Praça dos Heróis, com esculturas representando diversas fases da história húngara. Aqui já cheirava a Ocidente, sobretudo na elegante rua Vaci Utra, onde já se tinham instalado lojas de moda das marcas mais afamadas do mundo.

 

            A excursão terminou em Viena, capital da Áustria, onde, além da panorâmica da cidade, visitámos demoradamente o Palácio de Schoenbrunn, residência, no século XIX da princesa que foi imortalizada com o nome de Sissi, pela sua beleza e se tornou um ícone da minha juventude ao ser incarnada, no cinema, em filmes da Romy Schneider.

 

            Á noite, enquanto os nossos companheiros foram a um jantar típico que não nos despertou interesse, procurámos ir à célebre Ópera da Cidade mas, como não havia bilhetes, decidimos passear a pé pelas ruas cheias de gente nas esplanadas e num comboiozinho turístico que ajudou a não nos cansarmos demasiado.

 

            Achámos que Viena merecia mais. E há uns três anos, mais propriamente em julho de 2003,  tinha eu acabado de fazer uma quimioterapia, resolvemos ir passar quinze dias à Áustria, a começar por Viena, onde ficámos alojados, tal como depois em Salzburgo, num confortável aparthotel arranjado através de um clube de férias em que estivemos filiados durante vários anos. Na sua pequena “Kitchinette” fazia o pequeno-almoço e um jantar ligeiro. Almoçávamos sempre fora e tivemos muito tempo para conhecer o que de melhor oferece esta magnífica cidade. E também para ficar a saber que não é só em Portugal que os carteiristas actuam.

 

            A nossa primeira visita foi à Catedral de Santo Estêvão, que é espectacular, tanto por dentro como por fora e, do telhado onde se podia subir, deslumbrámo-nos com uma vista parcial da cidade, que é bastante grande. Ao terminarmos a visita, dirigi-me à livraria para comprar um livro sobre a Catedral. Comprei o livro, paguei e, logo de seguida, me dei conta de que o meu porta-moedas tinha desaparecido. No dia seguinte, ao regressar de um supermercado próximo do hotel, o Vôvô que esperava por mim, ao ver-me entrar, estranhou-me o semblante e disse-me a brincar: “não me digas que foste roubada outra vez”. E era verdade, com uma diferença de 24 horas, tinha sido vítima de carteiristas uma segunda vez na capital das Valsas!

 

            Além de espectáculos, museus como o célebre Albertina, fizemos uma visita ao Belvedere do nosso já conhecido Schoenbrunn, e que é um conjunto de palácios e jardins, exemplo magnífico da arquitectura do espaço do séc. XVII: lagos, cascatas e esculturas de pedra e uma notável galeria de pintura, onde estão representados pintores italianos, entre os quais Ticiano. No primeiro andar há obras de Klimt e de Kokoschka.

 

            Fizemos também uma visita guiada à Ópera, fechada naquele período de verão e que nos decepcionou um pouco. Depois fomos até à ONU City, um espaço semelhante ao nosso Parque das Nações, apenas no que diz respeito a edifícios, e onde descobrimos uma avenida com o nome do nosso conterrâneo Aristides de Sousa Mendes.

             

              Ainda em Viena, passámos pelo Bairro Modernista da autoria de Hundert Wasser: casas pequenas, cobertas de vegetação para se integrarem na natureza e o Museu Hunderwasserhaus, importante tanto do ponto de vista artístico como testemunho humano e ético do seu autor. Impunha-se uma visita à notável Torre do Danúbio, uma alta torre de televisão com um restaurante rotativo, semelhante ao

que visitámos há pouco tempo na nossa visita a Berlim como contei numa carta anterior. Dela se tem a vista mais espectacular de Viena e sobre o rio que lhe dá o nome.

                      

                                     Viena e Danúbio vistos do alto da Torre da TV

 

            Também visitámos o Prater, uma espécie de Feira Popular, um pouco decadente. Mas tem a Grande Roda, celebrizada até em filmes, como “O Terceiro Homem”, donde desfrutámos de novo uma soberba panorâmica da cidade.

 

            Desta vez fomos fazer o habitual passeio das excursões, mas só nós dois, à floresta de Grinzing célebre pelas suas tabernas típicas, tendo lanchado numa delas: a apfelstruder e um copo de vinho da região. Ao jantar há folclore mas nós tivemos apenas, a abrilhantar a merenda, a música do violino dum velhote que já devia ter tido a sua época de glória.

 

            De Viena, fomos, em excursão, à floresta da Baixa Áustria, com bonitas aldeias, grandes conventos, ruínas de fortalezas nas colinas arborizadas e vinhedos. A certa altura parámos e fomos de barco pelo Danúbio até Melk, objectivo último do nosso passeio. Aí desembarcámos e almoçámos no restaurante do imponente mosteiro beneditino, um dos mais célebres monumentos barrocos da Áustria.

 

            Foi com muita pena que deixámos Viena e partimos de comboio para Salzburgo, onde ficámos a segunda semana.

 

            Salzburgo, atravessado pelo rio Salzach é a terra de Mozart: aí visitámos a casa onde nasceu, no centro histórico da cidade e, do outro lado do rio, aquela em que viveu, muito maior e com muito mais documentação escrita e áudio.

 

            Inúmeros motivos de interesse de Salzburgo, entre os quais a Igreja de São Sebastião, onde a missa observa o cânone anterior ao Vaticano II, toda em latim e com o sacerdote de costas para os fiéis; o famoso Parque Mirabell, com jardins deslumbrantes e o Museu do Barroco, a Catedral e o Domum – museu de arte sacra que lhe fica anexo, a Universidade, o Convento dos Capuchinhos, numa alto colina sobranceira à cidade, o Castelo e a Residence Galerie.

 

            O nosso último passeio, de barco, foi a Hellbrunn, com interessantes jogos de água nos jardins e um palácio maneirista que, depois de tantos outros da Áustria, já não nos impressionou muito. Mas, entretanto, fizemos uma excursão dum dia inteiro em direcção à Baviera, perto da fronteira com a Alemanha, que tivemos de atravessar.

 

            No caminho, visitámos as minas de sal de Berchtesgaden, de grande valor económico, com muitos motivos de interesse e onde a temperatura rondava os nove graus.

 

            Regressados ao autocarro dirigimo-nos a Kehlsteinhaus, local onde foi a casa de férias do ditador Hitler e dos seus colaboradores mais próximos, cujo acesso se faz a pé por um longo túnel no interior da montanha e, aqui, por um elevador que nos leva até ao cume A casa foi totalmente destruída para não se tornar num lugar de culto de neonazis, mas hoje o local é visitado por milhares de turistas, vindos de várias partes do mundo, e é ocupado por um restaurante e uma esplanada, que se atravessam para ir a um ponto ainda mais alto

                                

                                              O  Vôvô no ponto mais alto de Kehlsteinhaus

da montanha, donde se avista o lago Königsee que, ao descer, vimos de perto e onde se podiam fazer passeios de barco que nos estavam interditos, pois demoravam quatro horas.

 

            O regresso foi molhado, com a chuva a cair, mas as nossas férias na Áustria não podiam ter sido melhores.

 

            Há mais. Beijinhos e até à próxima.

 

           

 

           

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Segunda-feira, 01.10.07

                         

                           SIMPLES CAIXINHAS

 

                        Caixinhas cheias de rendas e laços.

                        Pacientes mãos as fizeram

                        para serem vendidas aos turistas

                        que em breve as mostrarão,

                        cheios de orgulho e de importância

                        como prova da sua viagem

                        em exótico cruzeiro de luxo.

 

                        E são apenas caixinhas de madeira,

                        enfeitadas, por mãos pacientes,

                        a finas tiras de cortiça de bétula.

                        - Com amor de artistas

                        ou com o desespero da penúria?

 

                        A bordo do “Constantin Fedin”,

           no rio Volga, Setº 2001

                        Clementina Relvas

                       

publicado por clay às 12:46 | link do post | comentar | favorito

                         

                        A CORTIÇA DAS BÉTULAS

 

                        A cortiça das bétulas, tão doce,

                        tão maleável nas mãos do artista

                        que estas isbas já não são choupanas

     mas casas-museu

     - para os turistas se não lembrarem

     da falta de água e luz

     e dos ornatos que a maioria não tem.

 

       Kidzi, (Rússia),  Setembro 2001

        Clementina Relvas

 

 

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