Mal chegou a primavera e o sol atingiu com os seus raios escaldantes as copas frondosas das árvores e arbustos, muito ciosos dos seus botões ainda fechados, estes começaram a abrir com uma rapidez inaudita.
As acácias, as alfarrobeiras, as gramíneas, as oliveiras e muitas outras espécies encheram os campos duma poalha dourada que, à primeira vista, até criava uma certa fascinação.
Os plátanos não se ficaram atrás e as ruas da cidade apresentavam um ar baço, cheio de minúsculas plumas que esvoaçavam por toda a parte e dificultavam a visão do céu,
habitualmente límpido.
A criança ia com o seu pai a caminho da escola e, como era a primeira vez que assistia a tão extraordinário espetáculo, ficou tão assombrada que começou a dizer ao pai:
- Olha. Papá, que dança tão linda…Atchim!
O pai tentou uma explicação, simplificada, para o seu menino de quatro anos e já tão observador:
- Sabes, Afonso, essa é a dança do pólen, que, como tudo na vida, tem coisas boas… Atchim, atchim! e coisas más, conclui enquanto assoava o seu nariz e o do menino, ambos pingando como torneiras mal fechadas.
Entretanto, tinham chegado à escola e a conversa quedou-se por ali.
No dia seguinte era sábado e, no meio dos seus programas infantis, a criança passou por um anúncio que lhe chamou logo a atenção: eram imagens muito coloridas, em que os mais variados botões se defrontavam, numa autêntica guerra de pólen: uns, redondos, explodiam como balões, outros, em forma de canudo, eram autênticos canhões, mas todos a inundar o ambiente com uma densa camada amarela.
O menino não percebeu muito bem o que se estava a passar e correu a pedir ao pai que lho explicasse. Resguardado dentro de casa e com as janelas bem fechadas, o pai acrescentou àquilo o que, no dia anterior, os espirros lhe não tinham deixado concluir:
- Lembras-te, Afonso, do que nos aconteceu com os espirros? Foi por causa do pólen dos plátanos, que dá grandes problemas às pessoas que lhe são alérgicas. E são muitas… Então houve alguém que conseguiu criar um medicamento para essa sensibilidade ao pólen. E, claro, tratou logo de por esse anúncio na Televisão para fazer publicidade.
- Que maçada isso do pólen, não é, Papá? Mas tu disseste que ele também tinha coisas boas. Quais são?
- O pólen ajuda ao desenvolvimento das plantas, graças às abelhas, ao vento, às aves e até às pessoas que o transportam até elas. E há uma coisa de que tu ainda vais gostar mais: há as abelhas chamadas melíferas, que transportam o pólen para as suas casinhas, as colmeias e ali fabricam o mel, com que tu, tantas vezes, barras o pão do lanche.
- E é tão bom! Se for do Vôvô, que tem muitas colmeias na quinta, ainda sabe melhor.
- Porque esse é de rosmaninho. Mas há-os das mais variadas flores e são todos bons, se se tratar de mel puro.
- Ó Papá, logo à noite, vou pedir ao meu Anjo da Guarda que proteja também as abelhas, tão boazinhas.
- E olha que bem precisam, bem precisam.
Lisboa, 15 de Abril de 2011
Clementina Relvas