Meus queridos netos
Em excursões mais alongadas, visitámos Cognac, que todos conhecem pela famosíssima aguardente Napoléon e outras bebidas espirituosas. Aí, depois da visita à destilaria, fomos mimados com uma recepção no parque da propriedade.
Noutro passeio, percorremos, também, de barco, os canais da «Venise Verte», que são os pântanos da Vendée e a floresta de Mervent, tendo, nesse dia, almoçado no «Vieille Auberge», um restaurante típico de muita qualidade e visitado, entre outros monumentos, a Igreja românica de Vouvant, do séc. XI, que entrou no imaginário popular, pois diz a lenda que foi construída numa só noite, por uma fada com esse nome e que inspirou o seguinte poema popular:
Une place élevée sur une haute colline,
Des remparts féodaux et la Tour Mélusine,
Une église romane au portail émouvant
Le charme est permanent et partout à Vouvant.
Não contentes, porém, com todas as maravilhas da região, a Charente Maritime, houve um grupo de colegas que organizou, em autocarro turístico, uma excursão a dois dos lugares mais encantadores e emblemáticos de França: Saint-Mâlo, na Bretanha e o Mont Saint Michel, já na Normandia.
A primeira é chamada a «cidade corsária», por ser berço de corsários célebres, como Surcouf. Mas é também o local onde, numa ilhota face à cidade, se encontra o túmulo de Chateaubriand, um dos mais célebres poetas franceses do séc. XVIII. Como não tínhamos muito tempo, limitámo-nos a admirar, percorrendo as muralhas que a cercam, a «Cidade Velha» e a célebre “Tour Quic-en- Groigne”, onde existe um Museu de Cera, com a reconstituição de aspectos históricos, etnográficos e folclóricos de grande interesse.
Atravessando a Bretanha, onde ainda nos cruzávamos com mulheres exibindo as suas altas e brancas toucas típicas, deparava-se-nos, a cada passo, um magnífico Calvário de pedra, cujo culto ainda permanece vivo.
O Mont Saint Michel é uma autêntica jóia no meio do mar, ligado à terra por uma única passagem encimado por uma abadia românica, com a parte superior em gótico flamejante. Aí, visitámos os Três Museus: o Histórico, o do Historial e o Audiovisual. Passeámos nas suas ruas antigas, com casas muito bem preservadas e tivemos a sorte de assistir ao encher da maré, que é um fenómeno quase instantâneo, perigoso e assustador.
E agora, dirão vocês para os botões, se os tiverem: «Mas, afinal, que Curso foi esse, da Vóvó, que passava o tempo a passear?»,
Estão muito enganados, pois tinha um horário muito preenchido e nunca faltei a nenhuma aula. Além de que, conhecer novas terras e pessoas diferentes também é uma forma de nos cultivarmos.
Como já disse, a Residência ficava longe do Instituto, onde o Curso era ministrado por professores da Universidade de Poitiers e, como eu era a única que tinha despertador, levantava-me todos os dias às sete horas, para acordar a malta e nos aprontarmos para começar as aulas às oito e meia e acabá-las ao meio dia e meia. Estudávamos «O Ensino do Francês Língua Estrangeira» e, à tarde, tínhamos conferências de Literatura e Civilização Francesa ou fazíamos visitas acompanhadas e excursões como vos contei na carta precedente.
Passámos, em La Rochelle, o dia nacional da França, o 14 de Julho. Fomos todas para uma esplanada do «Vieux Port»,onde assistimos aos festejos, que achámos bastante fracos: apresentaram folclore da Argélia e de Cuba (miúdos), fanfarras também muito inferiores às nossas filarmónicas e, caída a noite, houve fogo de artifício entre as duas Torres que, não sendo mau, nada tinha a ver com os nossos espectáculos pirotécnicos. No fim, houve um interessante desfile de iates, abundantes naquela zona, onde há muitas marinas, seguido dum baile popular que me disseram ter-se prolongado até às seis da manhã.
No final do Curso, tivemos uma recepção na Câmara de Comércio e Indústria de La Rochelle, que consistiu numa soirée dançante, animada por uma orquestra local e seguida dum bem servido beberete.
Voltei ainda duas vezes a França, mas só a Bayonne, onde, a convite da Milú, Presidente da Associação França-Portugal, fui fazer duas conferências: uma sobre «A mulher na Literatura Portuguesa» e outra sobre «Os Poetas portugueses e o Mar». E tenho muitas saudades…
Beijinhos da Vóvó, em português, em francês e em todas as línguas mesmo nas que desconheço.