Ainda há pouco tinha aprendido a ler quando, um dia, no meio das terríveis notícias da II Grande Guerra que o meu Avô escutava avidamente, me apareceu, no Jornal de Notícias, um breve conto que me causou a maior das estranhezas; um grupo de crianças, mais ou menos da minha idade, empenhava-se num jogo muito estranho: a caça aos ovos da Páscoa. Os adultos escondiam-nos aqui e ali, detrás dos lilases e das coroas de noiva dum belo jardim, e o vencedor era o que descobrisse o maior número do, para mim, extravagante troféu. Eu só conhecia os “ovos de oiro” da lenda contada e recontada pela minha Mãe e em cuja existência muito me custava a acreditar. E apertava-se-me o coração ao imaginar que o ignorante lavrador, para enriquecer rapidamente, matava a famosa galinha que, além de dois ovos banais, apenas o consolara com uma saborosa canja.
Ora, tudo isto, exceto os ovos de oiro, claro, fazia parte do meu dia a dia, enriquecendo, quer fossem cozidos, estrelados ou mexidos refeições habituais na nossa mesa. Ah! E falta falar da grande tijela de barro onde, durante a Quaresma, se iam acumulando os ovos que haviam de entrar na confeção do folar da Páscoa, ou mais correntemente falando, a bola da Páscoa que não era doce, mas feita em três camadas de massa fofinha, separadas por um recheio de presunto, chouriço, frango guisado, e, depois de lêveda, pincelada com gemas de ovo batidas, que pareciam
provir dos tais ovos de oiro da lenda.