Meus queridos netos:
É esta a terceira vez que vimos a Roma, mas são tantas e tão importantes as maravilhas que esta cidade tem para mostrar, que muito ficará ainda por conhecer: por exemplo as catacumbas, testemunho do que foi a vida dos primeiros cristãos nesta cidade e que sempre desejei visitar. Mas, desta vez, acompanha-nos a lembrança de S. Paulo que, depois dos meses passados em Malta e alguns dias em Puzzuoli, se dirige a Roma pela via Ápia para, como cidadão romano, ser julgado pelas autoridades imperiais. Aí se integra na comunidade judaica, ficando a viver numa casa que lhe é atribuída, embora sempre guardado por um soldado romano. Continua a fazer a sua evangelização, mesmo nas condições adversas do julgamento e parece ter sido decapitado mais tarde no sítio das Tre Fontane, como referirei mais adiante.
Ficámos instalados no hotel Michelangelo que, além dum certo requinte (mobílias lacadas, bom quarto com óptima casa de banho, ampla sala de jantar e boa comida), tem a vantagem de ficar muito perto do Vaticano, de tal modo que, das janelas dalguns quartos se via, ali ao pé, a cúpula da Basílica de S. Pedro.
Depois duma visita panorâmica da cidade, em que revimos os Foros, o Coliseu, o Arco de Triunfo de Constantino, o Circo Máximo, as sete colinas romanas, nomeadamente a do Palatino, o rio Tibre com o forte de Santo Ângelo e a Ilha Tiberina, (onde agora funciona um Hospital) e outros sítios históricos, dirigimo-nos para o Vaticano. A visita começou pelo “cemitério” dos Papas, cripta onde se encontra a maioria dos túmulos papais até João Paulo II. Há outras criptas mais antigas como a catacumba de S. Calixto, onde estão sepultados nove papas até ao séc. IV. Este amplo corredor, com monumentos funerários de ambos os lados, vai dar a umas escadas que levam directamente à Capela Sistina, célebre não só pela decoração, como pelo facto de ser aí que têm lugar os conclaves, as reuniões dos cardeais que, de porta fechada à chave (cum clave), elegem cada novo Papa.
A Capela ergue-se no lugar em que existiu, no séc. XIII, uma “Cappella magna”, que funcionava como capela palatina. Depois de várias transformações, chegou-se à actual, uma grande sala rectangular com 40,93m de comprimento, 13,41m de largura e 20,70m de altura, as dimensões atribuídas pela Bíblia ao Templo de Salomão. Foi reconstruída no séc. XV e, em 1481 já artistas célebres como Peruggino, Boticcelli, Ghirlandaio e outros teriam executado alguns frescos da Capela. Mas foi Miguel Ângelo que, por incumbência do Papa Sisto IV, modificou profundamente o espaço, criando um universo de imagens incomparáveis, que ele executou durante quatro anos (1508 a 1512), deitado numa estrutura suspensa, para que as cerimónias religiosas pudessem continuar a realizar-se. Foi bastante mais tarde, em Abril de 1535, no pontificado de Paulo III, que Miguel Ângelo começou a pintar o Juízo Final, que ocupa toda a parede sobre o altar. É impossível dar uma ideia, ainda que pálida, da beleza, da riqueza de significados e simbolismos saídos do conhecimento e do talento de tais génios, mas posso dizer que desta vez, após a restauração a que as pinturas foram submetidas, entre l964 e 1994, maior foi ainda o meu fascínio e a minha emoção.
Assim, entrámos pela parte detrás da Basílica, o que me parece criar um menor impacto. A Basílica de S. Pedro é, actualmente, a segunda maior do mundo, depois da recente construção, na Costa do Marfim, da Basílica de Yamoussoucros, uma igreja católica romana (1985-1989), inspirada na Basílica de S. Pedro no Vaticano e consagrada, em1990, pelo Papa João Paulo II.
Segundo a tradição, a Basílica de S. Pedro está localizada no lugar exacto onde S. Pedro foi crucificado, por ordem de Nero, que aí mandou construir, depois, um circo romano. Sobre as ruínas deste foi erguida uma grande Igreja, no tempo de Constantino (326), que foi substituída pela actual Basílica, construída, de 1506 a 1526, sob o pontificado de Sisto IV, segundo o genial projecto de Miguel Ângelo e a supervisão do arquitecto Bramante.
Das inúmeras obras de arte que podemos contemplar na Basílica, destaca-se o enorme baldaquino de bronze, assente sobre quatro sólidas colunas também de bronze e em espiral, que protege o altar papal, por cima da cripta de S. Pedro; numa capela lateral, em grande relevo mas protegida por vidro à prova de bala, a magnífica escultura da Pietà, de Miguel Ângelo, a rígida estátua de bronze de S. Pedro, e inúmeras estátuas de santos, bem como monumentos funerários, entre eles o do Papa Júlio II que Miguel Ângelo não conseguiu terminar.
Depois do almoço, num restaurante próximo, decorado ao estilo clássico, fomos visitar, na via Acque Salvie, a Igreja de S. Paulo das Tre Fontane, erigida no local onde S. Paulo foi degolado, por ordem de Nero. Diz a tradição que a cabeça, ao separar-se do corpo, saltou e embateu na terra em três lugares diferentes, donde brotaram três fontes que ainda hoje correm. Encontram-se dentro do Santuário, do lado esquerdo, em pequenas grutas vedadas e encimadas pela representação da cabeça do Santo, em bronze. A Igreja de S. Paulo insere-se num complexo de mais duas, todas à guarda dos monges beneditinos. Fica já nos arredores de Roma, na zona em que Mussolini mandou construir, a partir de 1935, uma área comercial e de serviços, o Eur, onde se realizou a Exposição Universal de Roma e tiveram lugar os Jogos Olímpicos, em 1960. Da arquitectura, maciça, do fascismo, destaca-se um enorme prédio de andares, que foi chamado o Coliseu Quadrado, implantado na praça com esse nome.
Depois desta visita, onde assistimos à Santa Missa, diariamente celebrada pelo nosso prior, dirigimo-nos para Santa Maria Maior, uma Basílica esplendorosa, de que falarei na próxima carta.
Beijinhos dos Vóvós
Capela Sistina
Primeiro túmulo de João Paulo II
Basílica de S. Paulo Extramuros
À hora do almoço...